Por Silvana Salles*
Os turcos contam que as tulipas ficaram famosas no Ocidente por pura usurpação dos holandeses. Entre as muitas coisas que aprendi (sobre mim e sobre os lugares por onde passei) durante minha breve passagem pela Turquia, uma delas é que os guias de turismo farão de tudo para lhe mostrar um arraigado sentimento de nacionalismo que, dizem eles, seria uma das mais fortes características do país. É o discurso oficial turco. Outra lição, muito importante, é que as tulipas são nativas da Anatólia e áreas próximas.
Eu nunca havia viajado totalmente sozinha, nem para tão longe, até abril de 2011. Quando cheguei a Istambul, estava nublado, frio, as saídas do aeroporto estavam congestionadas… Parecia uma cidade grande como qualquer outra – até que notei que todos os canteiros estavam apinhados de tulipas.
Eu já sabia que abril era o mês do festival das tulipas na antiga capital do Império Otomano. Mesmo assim, era impressionante ver todas aquelas flores colorindo a cidade. Eram pétalas vermelhas, amarelas, brancas, laranja, cor de rosa; algumas, inclusive, eram bicolores. Era impressionante também perceber como, em apenas dez dias, elas cresciam, ficavam gordinhas e começavam a abrir as pétalas.
Istambul é uma cidade incrível em muitos aspectos. Tem belíssimos palácios e monumentos, vistas fantásticas, museus bem organizados, bares baratos, comida deliciosa, uma multidão de boleiros e gente disposta a uma boa conversa de boteco. Istambul tem o Bósforo, com suas inúmeras balsas, barquinhos e navios cargueiros. E, sobretudo, Istambul tem muita, mas muita história para contar a quem se interessar.
No entanto, Istambul é também uma cidade com problemas parecidos com os de São Paulo. Tem trânsito pesado, bolsões de extrema pobreza, especulação imobiliária agressiva, violência, políticas higienistas e uma população de mais de 10 milhões de habitantes circulando pelo espaço urbano todos os dias. Por isso mesmo que eu guardo com carinho a lembrança das praças bem cuidadas.
Entendi que as tulipas, que todos os anos são plantadas pela prefeitura para o festival de abril, não estão nos canteiros simplesmente para embelezar as ruas. Elas têm uma missão muito maior: reforçar a identidade de uma cidade que, como outras grandes metrópoles do mundo, poderia ter demolido e esquecido suas raízes. As tulipas também contam histórias aos visitantes.
*Silvana Salles é jornalista e tem o blog polemicagratuita.wordpress.com
Pra mim, a tulipa é a flor mais linda que existe. Istambul deve ser incrível.
Um texto que ensina (pois não sabia que as tulipas eram originárias da Anatólia), e envolve pela sensibilidade com que foi escrita.
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Infelizmente, não cheguei em Istambul em abril para apreciar tal espetáculo, mas é impossível não amar esta cidade tão antiga, porém, tão moderna. Silvana Salles, o seu texto além de instrutivo é também leve, como um bate-papo com amigos. Parabéns.